sábado, junho 02, 2007

Conceitos em má companhia

Conceitos em má companhia

Pelas minhas reflexões selvagens acredito que o conhecimento acontece no indivíduo que se apropria por sua percepção de informações remetidas pelo meio que habita. A geração de conhecimento é uma reconstrução das estruturas mentais do sujeito através de elaborações de sua consciência cognitiva, sensibilidade e inteligência.

Penso que esta apropriação é subjetiva e diferenciada para cada indivíduo e acontece na privacidade de sua solidão fundamental. É uma interiorização independente da estrutura em que está a informação ou do número de pessoas conectadas com a mesma informação. No final do processo de geração do conhecimento não haverá, no conjunto de pessoas, uma massa homogênea por ser fruto de uma fonte comum, mas uma coleção de percepções individualizadas.

Seja no isolamento da leitura individual ou no povoamento de uma rede na web a interiorização do conhecimento nuca será homogênea, de massa. Será sempre uma agregação de heterogeneidades.

O ser humano é privilegiadamente uno na lucidez de sua inteligência para assimilar a informação, mas nunca competitivo ou coletivo ao se posicionar no momento do conhecimento.

A inteligência como " lucidez é um dom e um castigo. Está tudo em uma palavra. Lúcido vem de Lúcifer, o arcanjo rebelde, o Demônio. Lúcifer é também o luzeiro do amanhecer, a primeira estrela, a que mais brilha e a última a se apagar. Lúcido vem de Lúcifer, Lúcifer, de Lux e Ferous que quer dizer: aquele que tem luz. Que gera luz. Que permite a visão interior. Deus e Demônio tudo junto. O prazer e a dor. Lucidez é dor, e o único prazer que podemos conhecer, o único que se parece remotamente à alegria é o prazer de permanecer consciente da própria lucidez. O silêncio da compreensão, o silêncio do simples estar. E nisto se vão os anos, nisto se foi a bela alegria animal". [Alejandra Pizarnik]. [http://www.cibernetic.com/ALE/index.html ]

Conceitos como inteligência, conhecimento, percepção, competição, gestão, coletivo podem se juntar, e ficar em má companhia,. Isto para atender a interesse da moda ou de um marketing de atração ou para simular a novidade. No mundo do entretenimento ou do espetáculo podem ser combinações sem maldade para suprir a pauta do palco ou renomear o antigo para torná-lo mais atrativo na aprendizagem de extensão.

Se informação quer conduzir ao homem livre e iluminado; se a inteligência indica o entendimento e a articulação de significados para uma referência subjetiva entre o sinal e o referente; e se a competição relaciona uma busca simultânea, de dois ou mais indivíduos, por uma melhor vantagem individual, então a reunião dos três conceitos estabelece uma má companhia pelo menos na ética dos templos voltados ao saber.

Da mesma forma, entendemos que os modos de observar o mundo têm variado ao longo do tempo. Com a Internet foi prestigiada a idéia de que, na busca do conhecimento, o pensamento e o espaço coletivo, predominam sobre a individualidade da inteligência. Contudo, acredito que o espaço do conhecimento público agrega inteligências individuais e privadas. Estes espaços, ou redes, unem fragmentos que podem alinhavar um mosaico para se intuir um significado novo ou mais criativo. Nunca se deve confundir a informação que circula neste estado coletivo com uma massa homogênea e uniforme, fruto da reunião de muitas inteligências.

O escritor Pierre Lévy que cunhou o termo inteligência coletiva escreve logo no início do seu livro do mesmo nome: " Como deve ter ficado claro a inteligência coletiva não é um objeto puramente cognitivo. A inteligência deve ser aqui entendida como a expressão trabalhar em perfeito acordo ou no sentido que tem quando se fala em entendimento com o inimigo." *

Conceitos em má companhia são desculpáveis em alguns ambientes, mas completamente impróprios em outros.


* Levy, P, Inteligência Coletiva, Instituto Piaget, 1994,Lisboa