sábado, março 30, 2013

Um abismo geracional separa professores e alunos afetando as relações de admiração e respeito que estimulam o desejo de aprender



Um abismo geracional separa  professores e alunos afetando as relações de admiração e respeito que estimulam o desejo de aprender

             trechos de um artigo de Rosiska Darcy De Oliveira*

Uma mudança de era deu lugar a um abismo geracional que separa professores e alunos, minando as relações de admiração e respeito que, no passado, estimulavam o desejo de aprender. Os professores estão hoje a cavaleiro entre dois tempos; um passado em que conteúdos eram transmitidos de uma forma que hoje chamaríamos tradicional; um presente em que os alunos, digitais nativos habitam, fascinados, o espaço virtual como vida real e são habilíssimos em tecnologias que os professores mal dominam.

A virtualidade é o meio ambiente de uma juventude portadora dessas próteses cerebrais que são os celulares, prolongamentos de seus corpos, onde trazem armazenada — Google dispensando o trabalho da memória — toda a informação do mundo. Fotografam tudo que se passa como que deixando provas tangíveis do que é vivido em tempo real, marcando o instante, sem apelo à abstração da memória, seus caprichos e brumas.

Como tudo é registrado sem esforço, é o próprio esforço que se torna um comportamento raro e desvalorizado, o que representa um perigoso efeito colateral. Entre alunos e professores há distância e estranhamento. Por vezes, agressividade. A pletora de informações que cada um acessa quando tira o celular do bolso não implica que os jovens tenham a mínima ideia do que fazer com elas ou, pior, que saibam a diferença entre informação e conhecimento.

A aquisição de conhecimento depende do desenvolvimento de aptidões mentais e do domínio dos códigos culturais que permitem navegar com alguma coerência em um oceano de informações desgarradas. As informações disponíveis na internet são um tesouro literalmente incomensurável. Problemática é a exígua capacidade de processá-las e lhes dar algum sentido.

Assim como a palavra ganha seu sentido no texto e o texto ganha sentido em um contexto, a informação pede para se inserir em um patrimônio cultural que caberia à escola transmitir. A contextualização é condição da função cognitiva ao mesmo título que a consciência de ter aprendido, tão cara ao grande Jean Piaget. É a transmissão do patrimônio cultural e de valores que dão à juventude o sentido de pertencimento à aventura humana e estabelecem os vínculos de continuidade entre as gerações que se sucedem.

O desafio da educação é a formação de indivíduos aptos a pensar pela própria cabeça, capazes de transformar informações em conhecimentos, abertos à inovação e experimentação, afeitos à argumentação e escolha. O que Edgar Morin chama “uma cabeça bem feita”.  A vida em tempos de internet exige da escola uma metadisciplina, o aprender a aprender. Quem serão os professores dessa escola aberta ao desconhecido, sob forma de pesquisa, e ao inesperado, sob forma de criação?

Não há receita pronta de escola e sim ingredientes a combinar: a aquisição de conteúdos específicos com o aprendizado de competências transversais que permitam aos jovens dar sentido a si mesmos e a um mundo em que terão vida longa e as certezas curta vida."

Rosiska Darcy de Oliveira é escritora


*Partes do artigo de Rosiska Darcy De Oliveira, Publicado: 30/03/13 no jornal O Globo de 3-/03/2013. Leia mais sobre esse assunto emhttp://oglobo.globo.com/opiniao/uma-escola-sem-receita-7972677#ixzz2P1o0zPFG