segunda-feira, setembro 13, 2010

Um tesouro construído de palavras



O Thesaurus de Roget teve grande sucesso de público nos países de língua inglesa e foi também traduzido para diversas línguas. A palavra thesaurus etimologicamente significa tesouro tendo sido usado durante muitos séculos para designar um léxico, ou um tesouro de palavras.

Esta palavra popularizou-se a partir da publicação do Thesaurus of English Words and Phrases, de Peter Mark Roget, em Londres, 1852. O subtítulo de seu dicionário expressa bem o objetivo: classsified and arranged so as to facilitate the expression of ideas and to assist in literary composition (Roget, 1925)

O sentido actual da palavra remete a um catálogo classificado de palavras, reunindo-as pela ordem alfabética, de acordo com as “ideias que exprimem: conceitos abstractos, espaço, matéria, intelecto, vontade e afeição.

O Thesaurus de Roget expressa bem o que o autor pretendia com sua obra: classificar e ordenar para facilitar a expressão de ideias e auxiliar na narrativa. A questão é colocada da seguinte forma:um catálogo de palavras mostrando significados análogos vai sugerir, por associação, outras imagens de pensamento.

Na adaptação da obra de Roget para o francês o seu título ficou Dictionnaire idéologique: recueil des mots, des phrases, des idiotismes et des proverbes de la langue française classés selon l’ordre des idées. Assim nos países de língua latina os thesaurus e dicionários analógicos são também conhecidos como dicionários ideológicos no sentido de aumentação de ‘ideias’.

O Thesaurus de Roget é um peça importante na história da informação e sua técnicas e pode ser visto ou baixado integralmente no site:

Roget's Thesaurus of English Words and Phrases
http://www.gutenberg.org/files/10681/10681-h-body-pos.htm

domingo, agosto 01, 2010

sobre o ato de escrever textos acadêmicos




"Na palavra falada temos que ser, em absoluto, do nosso
tempo e lugar; não podemos falar como Vieira, pois nos
arriscamos ou ao ridículo ou à incompreensão. Não
podemos pensar como Descartes, pois nos arriscamos ao
tédio alheio. A palavra escrita, ao contrário, não é para
quem a ouve, busca quem a ouça; escolhe quem a entenda,
e não se subordina a quem a escolhe. Na palavra escrita
tem tudo que estar explicado, pois o leitor nos não pode
interromper com o pedido de que nos expliquemos melhor."
(Fernando Pessoa. O livro do desassossego)


"Não fomos construídos para ler. Na verdade, a leitura é uma aventura."
(Michael Merzenich, neurocientista)




Existe atualmente uma crise da escrita e leitura tradicional. Uma linguagem nova urdida no imediatismo dos meios digitais está querendo fechar um capitulo na história das narrativas impressas em formato papel. Desde 1990 as tecnologias da informação digital estão definitivamente inseridas no contexto do pensamento e dos atos para gerar e receber a informação. Fatos e ideias tinham um percurso formal e bem definido dentro de um mundo onde a textualidade era pautada pela escrita em papel. Existe, hoje, uma diferente configuração para plublicitar fatos e ideias.

O imaginário do receptor ampliado por novas visualizações na aventura hipertextual explodiu o formato dos meios tradicionais. Palavras e enunciados tem na condição digital um caminho de significantes liberados. Acredito que iniciamos um novo padrão da escrita e da leitura nestes tempos digitais. As pessoas, ainda escrevem com todo o maneirismo da escrita para o papel. Mas na tela, e só se pode ler um hipertexto na tela, existe um novo olhar para um novo documento que antes de tudo deve ser leve e agradável a esta apreciação diferenciada de uma leitura onde o imaginário se liberta no link. Uma escrita que não quer ser impressa.

Um artigo científico deve ser escrito com clareza, precisão e, sobretudo, quando todos vão ler na web com uma visualização adequada para esta leitura online. O leitor deve ficar interessado na narrativa para se manter conectado e ser capaz de entender o seu conteúdo facilmente. Uma escritura deve apresentar adequadamente os objetivos, o porquê e como foi escrito – a sua metodologia - os resultados encontrados e suas aplicações.

Artigos científicos e técnicos são recusados para publicação devido a qualidade na sua apresentação. Possuem frequentemente um excesso de informação irrelevante, ausência de conclusões precisas, tabelas e gráficos mal arranjados e em demasia e deficiência na apresentação dos resultados.

O escrever acadêmico é rico em citações. Mas deve ser lembrado que em cada citação o autor passa a autoria do seu texto para a voz de outrem. Se uma narrativa possui mais da metade de suas linhas como citações, incluindo alguns quadro e tabelas, a autoria é difusa e em rede. Não há mais um autor definido.

Pela mesma razão não se pode ter um texto de 20 páginas com muitas citações, links, quadros e tabelas de outra autoria e ao concluir tudo isso o seu autor o faz em apenas uma lauda. Como diria Pessoa “arriscamos ou ao ridículo ou à incompreensão”.

Além de manter uma boa organização na apresentação dos objetivos, fatos e conclusões, há que cuidar da ortografia e a gramática para que o leitor não tenha problemas para entender o que está dito. Ele não pode perguntar ao texto uma nova explicação.

Existem várias formas para se publicar um artigo técnico ou uma publicação científica, como: divulgação científica, revisão temática, descrição de aplicação de um modelo, um artigo de opinião do autor. Mas os artigos preferidos por editores e leitores são aqueles onde, em sua maior parte, existe um questionamento original e com nítida preponderância de enunciados reveladores de uma reflexão própria do um autor.

O que faz de um indivíduo um autor individualizado é o fato de podermos demarcar através de seu nome e da família de seus textos o pertencimento a uma área temática. Textos se conectam através de uma linhagem de vínculos semânticos determinados por aproximações e afinidades ao longo da institucionalização de um campo em uma cultura. O que faz de um indivíduo um autor é o fato de através de sua assinatura reconhecermos os textos que lhes são atribuídos. Se um conteúdo foi desenvolvido por uma rede ou um grupo de pesquisa esta autoria perde sua individualidade e é responsabilidade da rede ou grupo e não mais de pessoas únicas.

É preciso cuidar para não tipificar ou especificar seu artigo como uma simples descrição, sem uma reflexão, análise e avaliação de literatura; evitar textos cujo formato mostrem uma estrutura típica de uma “adaptação” de um trabalho de final de curso em novo aproveitamento. Os enunciados com autoria múltipla devem poder indicar a contribuição de cada um dos autores para o artigo de maneira clara e explicita no conteúdo. É preciso cuidar, ainda com narrativas excessivamente específicas e descritivas de um serviço ou produto ou que sejam fortemente baseados em um determinado contexto, um local geográfico ou uma empresa e seu produto.

Faça um título curto, que chame a atenção e reflita o tema principal do artigo. Não deve ser muito longo; registre o seu nome e a sua filiação institucional de forma uniforme e sistemática como usa em todas as suas publicações, para que seus artigos possam ser reconhecidos e citados de forma correta.

As pessoas se baseiam no Resumo ou no Abstract para decidirem ler ou não o artigo. Os indexadores eletrônicos da web vão varrer o seu resumo e o “abstract” para formar sua base. Assim, sintetize de maneira precisa os tópicos principais do artigo e as conclusões obtidas. Não utilize mais que 250 palavras nisso. Limite o número de tópicos inseridos para evitar confusão na identificação do conteúdo. Não inclua referências, figuras, citações, siglas ou equações matemáticas no resumo.

O Abstract é a versão do resumo em inglês. Por uma questão de coerência, ele deve possuir tamanho e significado compatíveis com o resumo. A versão em inglês não necessitará ser uma tradução literal do resumo, mas sim uma tradução adaptada à outra língua. Use frases de até 2 linhas no máximo. O leitor na língua inglesa não consegue perceber o significado em longas frases, entre vírgulas e com orações subordinadas e/ou coordenadas.

Por vezes, editores solicitam a inclusão de um conjunto de palavras-chave que caracterizem o seu artigo. Estas palavras serão usadas posteriormente para permitir, também, que o artigo seja encontrado por sistemas eletrônicos de busca. Por isso, você deve escolher palavras-chave que identifiquem os significados do texto. Um bom critério é selecionar as palavras que você usaria para procurar na web um artigo semelhante ao seu.

A introdução é uma síntese geral do conteúdo do artigo sem entrar em muitos detalhes. Especifique a relevância da publicação: explique como o trabalho contribui para ampliar o conhecimento em uma determinada área e se ele apresenta novos métodos ou modelos para resolver um problema; se ele é um trabalho de opinião do autor ou de um grupo de pesquisa. Apresente uma revisão da literatura com escritas básicas sobre o assunto, mas em sua maioria as publicadas nos últimos 5 anos e que sejam específica ao tópico.


Corpo do artigo:
Determine o problema estudado, explique a terminologia básica, e estabeleça claramente os objetivos e as hipóteses. Note que artigos são frequentemente rejeitados para publicação porque os autores apresentam os objetivos pouco claros ou de realização impossível.

Apresente as formulações teóricas. Informe a metodologia e todo instrumental e os métodos de trabalho de forma que os leitores sejam capazes de entender como o estudo foi realizado. Indique os procedimentos de uma forma coerente. Dê crédito ao trabalho de outras pessoas: não invente conceitos se não tiver uma base teórica que os suporte e forneça detalhes e definições dos conceitos discutidos ou indique a fonte que os explique.

Um problema comum em artigos técnicos é o uso inapropriado de tabelas e figuras que podem confundir os leitores. As falhas principais seriam: a falta de análises das estatísticas tabeladas, a abundância de percentuais e numerais no texto, falta de nitidez do escrito dentro de figuras, tabelas e gráficos.

Tabelas devem ser incluídas quando se deseja apresentar um número pequeno de dados e se recheadas de texto inibem a leitura. Lembrar que a maioria dos artigos vai ser disponibilizada na web e necessita ter uma boa visualização do conteúdo. Evite um conteúdo recheado indicações em caixa alta, negritos, e sublinhados. Nunca apresente uma sigla substituindo o extenso e não use frases de mais de 50 palavras. A seção Resultados deve apresentar as reflexões sobre as evidências de seu estudo. Se não puder escrever com facilidade sobre a importância de suas evidências o artigo não merece ser escrito. Conclusões e resultados devem ter pelo menos 5 laudas

Você pode iniciar a sua conclusão mostrando o que é novo e relevante em seu texto. A conclusão deve ser analítica, interpretativa e incluir argumentos explicativos. Deve ser capaz de fornecer um dialogo conceitual lógico e coerente dos resultados apresentados e suas possíveis aplicações. Forneça informações completas sobre as referências utilizadas. Um artigo mesmo com a forma de um ensaio de reflexão do autor, não deve conter menos que 50 referências. Insira como anexo as informações que não são precisam ser visualizadas no texto principal como: questionários, entrevistas, descrição do software utilizado, relação bruta de dados.


Roteiro para checar o texto antes de enviar para publicar:

1 Título: reflete o conteúdo, as palavras utilizadas são apropriadas.

2 Precisão do texto: as informações estão claras sem excessos de diagramas; os parágrafos estão adequados para leitura.

3 Estilo: o conteúdo está correto e de visualização adequada para a web?

4 Apresentações dos dados: tratamento das figuras e tabelas esta adequado; há algo que deveria ir para o anexo.

5 Justificativa: foram esquecidos artigos históricos ou clássicos na revisão; Foi obedecida uma cronologia;
como foi abordado o arcabouço teórico adotado e como este arcabouço está inserido no campo do artigo;

6 Está explicitado: o tipo de metodologia utilizada; os instrumentais e os métodos usados; o local de realização da pesquisa; ( entidades envolvidas); os critérios de inclusão e exclusão de dados; as variáveis estudadas e sua mensuração?

7 No conteúdo : as principais perguntas foram respondidas; os erros ortográficos e de concordância são só acidentais? O estilo de redação é bonito, direto, claro e objetivo? A sequência de raciocínio é lógica e faz sentido? A visualização é de boa qualidade tanto para a mídia impressa quanto digital; o mesmo estilo foi utilizado em todo o texto? Há excesso de formatação no texto ou muitas figuras, tabelas, etc.; os anexos são relevantes.

8 Resultados: os resultados encontrados são coerentes; foram apresentados de forma assimiláveis; foram enfatizados os resultados inovadores; foram discutidas as limitações dos resultados; a a apresentação está adequada.

9 Conclusões: estão apropriadas e corretas? ( em harmonia com os objetivos? Com a metodologia e os métodos? Com os resultados esperados?); as descrições das conclusões têm um espaço coerente para tratamento das reflexões finais do autor? Foram enfatizados os principais resultados encontrados; as questões colocadas no texto foram respondidas nesta finalização.


Finalizando é importante ressaltar que a velocidade da escrita, da leitura e sua assimilação mudaram, assim como mudou a quantidade de informação à qual estamos expostos. A intenção destas notas é evitar o estresse cognitivo do leitor, apresentando a informação de maneira visualmente destinada para a percepção amigável. Sempre é conveniente lembrar que: “toda leitura é uma aventura” e é o autor que registra o script dessa odisséia.

Aldo de Albuquerque Barreto

ver também: "As palavras voam, a escrita permanece" em
http://www.dgz.org.br/out04/Art_01.htm

segunda-feira, maio 31, 2010

A Biblioteca guarda o nome de todas as Coisas


Um dia veio uma peste e acabou
com toda a vida na face da terra
Em compensação ficaram as bibliotecas
E nelas estavam meticulosamente escrito
o nome de todas as coisa! *


Dizem que uma imagem vale mais que mil palavras no nosso imaginário; o filme uma imagem em movimento tem, portanto, incalculáveis apelos a nossa sensação e sentimentos: uma explosão de nossa imaginação.

É o que acontece com o filme "Agora" que mostra em sua narrativa o incêndio da biblioteca de Alexandria e reacende o “fogo” das paixões relacionados à biblioteca e seus livros.

A Biblioteca de Alexandria original foi destruída há 1.700 anos pelo fogo e foi reconstruída quase no mesmo local; a reconstrução levou 20 anos para ser concluída e a magnífica obra foi reinaugurada em 2002. Logo depois o fogo destruiu parte de seu complexo cultural recentemente inaugurado. A biblioteca reacendeu seus laços com o fogo, desta vez não tão devastador.

Conta à história que há 1700 anos, quando o exercito inimigo capturou Alexandria , um intelectual Grego pediu ao comandante das forças de ocupação para salvar a Biblioteca, o pedido seguiu a linha de comando até chegar ao chefe que respondeu:

“Se estes escritos estão de acordo com o Livro de Deus eles não tem qualquer valor e não precisam ser preservados; se deles discordam eles são perniciosos e devem ser destruídos”.

Há nessa frase toda uma história de ocultamento da informação por questões de poder, política e religião, que perduram até hoje. Talvez o debate sobre Biblioteca como a fonte de saber venha da enorme responsabilidade colocada no valor simbólico desta estrutura de informação:

"As bibliotecas, ao longo dos séculos, têm sido o meio mais importante de conservar nosso saber coletivo. Elas foram e são ainda uma espécie de cérebro universal onde podemos reaver o que esquecemos e o que ainda não sabemos..... uma biblioteca é a melhor imitação possível, por meios humanos, de uma mente divina, onde o universo inteiro é visto e compreendido ao mesmo tempo."

"Mas é próprio de nosso trabalho, do trabalho de nossa ordem e em particular do trabalho deste mosteiro, aliás, a sua substância – o estudo e a custódia do saber, a custódia digo não a busca, porque é próprio do saber coisa divina, ser completo e definido desde o inicio, na perfeição do verbo que exprime a si mesmo.... Este é o trabalho de nossa abadia com sua com sua esplêndida biblioteca. Não há progressos, não há revoluções de períodos na história do saber, mas no máximo, continua e sublime recapitulação.." discurso do abade Jorge sobre a biblioteca do O Nome da Rosa de Eco

Há nestas citações de Humberto Eco toda uma ideologia de poder, do secreto e do sagrado que é associado à instituição.

A mesma forma de exclusão pelo preconceito foi filmada em "Farenheit 451" A realidade descrita no filme de Truffaut, mostra um Corpo de Bombeiros que tem a função de queimar livros. Neste futuro hipotético, os livros e toda forma de escrita são proibidos pelo regime, pois torna as pessoas infelizes e improdutivas. Se alguém é visto lendo é preso para reeducação. Se uma casa tem muitos livros "bombeiros" são chamados para incendiá-la. Mas, existe uma terra dos homens-livro, pessoas que memorizavam seus livros para publicá-los no futuro. À possibilidade de ler alia-se, novamente, aos privilégios do poder ser, poder fazer, poder decidir par gerar a superstição .

Uma outra indicação do travamento do uso da biblioteca devido sua estrutura foi quando da inauguração do Centro Georges Pompidou, no centro de Paris em 1977, como espaço voltado para a cultura e o saber. O Centro mostrou o efeito a alienação provocada pelos "Palácios do Saber”, ou seja, o tratamento espetacular dado a uma área em contradição com o intento instrutivo e formativo daqueles espaços. O centro foi visto por muitos como labirintos, onde as pessoas se sentiam pouco à vontade de acordo com seu habitus de convivência. Os visitantes reclamavam que não podiam contar com suas condições cognitivas para lidar com as referências engendradas pelo espaço que provocava uma sensação de desconforto. Algumas e se sentiram ameaçadas ou mesmo enganadas.*


A responsabilidade colocada na biblioteca, como tendo uma resposta às questões universais, pode ser a culpada pelo seu estranhamento com o mundo. Poetas escritores e violeiros cantam que a biblioteca é eterna e possui todos os conhecimentos; daí espera-se encontrar ali, também, as respostas para todas as questões do universo: guerra, paz, justiça e injustiça, poder, violência. Colocaram opções pesadas para a biblioteca responder. Porém a resposta de tudo não esta só ali, a biblioteca guarda a informação, a resposta está no conhecimento que é fruto da razão e do coração dos homens, os mesmos muitas vezes querem vê-la queimar.

Aldo de A Barreto


*AGORA - O filme
http://movies.nytimes.com/movie/453107/Agora/trailers

* As Bibliotecas, Mario Quintana, Preparativos de Viagem, 1987.

* Umberto Eco é romancista e semiólogo. Os fragmento são do texto Muito além da Internet, de dezembro 2003,e de seu livro O nome da Rosa.

* Centro Nacional de Arte e Cultura Georges Pompidou - Les immatériaux http://www.dgz.org.br/abr10/Art_02.htm

quarta-feira, abril 28, 2010

A SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO


A SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO NO BRASIL

A Sociedade da Informação em minha visão é o espaço em que se torna universal o acesso aos conteúdos de informação dos estoques de documentos institucionalizados, para uso de todos os habitantes de uma realidade. Quando esta condição só se realiza os possíveis beneficiários do contexto informacional podem elaborar esta informação, em proveito próprio e para o desenvolvimento e da realidade, onde partilham sua odisseia individual de cidadania.

Não se deve confundir a sociedade da informação com a sociedade do conhecimento. Embora partilhando da mesma intenção, a sociedade da informação é uma utopia de realização tecnológica e a do conhecimento uma esperança de materialização de ações para um saber compartilhado.

Na sociedade do conhecimento o indivíduo quer se realizar na sua realidade saindo do estado de não emancipação em que foi colocado. A sociedade da informação está limitada ao avanço de novas técnicas de acesso, disponibilização e uso da informação. A do conhecimento não tem limites se as competências forem adequadas.

A velocidade e facilidade de acesso à informação através dos novos meios eletrônicos revogam as condições de consumo de significados estabelecidas no estatuto do cidadão; mas não tem incidido com igual impacto na sua cultura ou favorecido sua identidade nacional. No momento em que o Brasil cuida melhorar as condições técnicas para plena inserção na sociedade da informação é vital que se estabeleçam políticas que se voltem para prover conteúdos para as identidades culturais do país afim de que se possa chegar a sociedade do conhecimento. Algo que se sobrepõe as discussões de bandas de acesso e seu custo.

A interiorização da informação pelo indivíduo envolve uma série de fatores que estão fora da competência ou governabilidade de um instrumento para uma sociedade da informação. Uma política de informação deve tratar de informação e esperar que as existam políticas voltadas para o crescimento intelectual dos indivíduos que lhe capacite assimilar conteúdos informacionais.

O Livro Verde, lançado no ano 2000 é um documento correto para uma política de uma sociedade da informação. Contou com a colaboração de inúmeros cientistas e especialistas de diversas áreas. Foi idealizado e realizado com muita criatividade, dedicação e respeito aos seus propósitos.

O documento deixa clara a necessidade da existência de parcerias (pg. 11, capitulo 1) quando afirma: "ao governo cabe construir os "backbones" para universalização do acesso e algumas aplicações próprias de Estado; a sociedade cabe viabilizar e articular os conteúdos e as aplicações de interesse específico; mas o investimento para fornecer produtos e serviços, com a necessidade de manter uma continua densidade tecnologia em inovações, esta é uma tarefa do setor privado."


Há que considerar, ainda, que o programa da sociedade da informação, preconizado no Livro, foi realizado por um dos Ministérios do governo e por estar neste nível hierárquico não teve força política para sua implantação. Todo governo é sensível a sua gradação da autoridade e aos círculos de predomínio de poder estabelecido. Após a edição do Livro Verde pela Ciência e Tecnologia outros setores do executivo lançaram sua própria política de informatização social independente.

O documento, em minha opinião, tinha duas opções: ou ser abrangente e indutor como é ou ser específico, por exemplo, tratar só do acesso universal e da informação em ciência e tecnologia, e então correr o risco de não ter uma plateia muito grande e, talvez ter, a responsabilidade de administrar a execução das ações propostas.

Assim, o plano verde escolheu ser grande e aí se perdeu na burocracia das intenções de poder de cada setor do governo. Permanecerá, porém, um excelente documento. Uma diretriz para organizar e induzir ações, para uma sociedade mais justa na organização, acesso e divisão da informação. Moderno como demonstrou a indicação positiva realizada na mídia de abril de 2010, dez anos após sua edição

(AAB)

Ler ou baixar O Livro Verde da Sociedade de Informação no Brasil - Uma política de Informação
http://www.mct.gov.br/index.php/content/view/18878.html

quinta-feira, abril 15, 2010

O Ruído Rosa



Uma parte do pensamento filosófico de Heidegger tem sido considerada relevante para a ciência cognitiva e aparece no capítulo III do Ser e Tempo,onde Heidegger distingue modos de experimentar o mundo. A maioria das atividades humanas argumenta é absorvida no envolvimento de habilidade com as entidades do mundo. Quando lidamos com habilidades de cognições pré-estabelecidas podemos experimentar interações como sendo uma extensão do nosso corpo.*

O nosso compromisso com as entidades como extensão do corpo não implica na consciência explícita de suas propriedades. É uma simbiose que se estabelece com uma sincronia de uma frequência denominada de “ruído rosa”.

Isso aparece quando usamos,por exemplo, o mouse como uma interface para interagir com um computador. Quando estes atos se processam na frequência cognitiva descrita como um “ruído rosa” o mouse e o computador passam a ser uma extensão de nosso corpo.
Se, contudo, uma dificuldade aparece neste intercâmbio e nos tornamos conscientes do artefato a frequência é quebrada e a interação como extensão cessa até que se estabeleça um novo estado de sincronia apropriado.*

É importante saber que habitamos duas realidades na mesma época. A anfibiedade em que vivemos é a capacidade adquirida de habitar e interatuar em contextos e condições diferenciadas. O nosso viver pode estar em dois espaços: o da realidade da existência e o da realidade potencial onde existimos metaforicamente. É a duplicidade do animal que habita a terra ou na água. Aterrado no viver físico ou libertado no mundo virtual; corporalmente distinguido em cada realidade, por adereços que podem se agregar a sua pessoa virtual.

Eu existo virtualmente em um mundo sem distancia espaço ou tempo definido. Minha vivência é a das conexões e meu destino são os meus links. Virtualmente existo na translação da metáfora, na transferência das minhas narrativas para um âmbito simbólico que não é fixo, físico ou designado; ele se fundamenta num movimento sem corpo definitivo. Uma relação de separação entre dois instantes, dois lugares ou dois estados do ser.
(AAB)


* Relações entre uma teoria da educação e seu fundamento ontológico e epistemológico.
http://www.webartigos.com/articles/10401/1/Educacao-Epistemologia-e-a-Crise-dos-Paradigmas/pagina1.html


** A Demonstration of the Transition from Ready-to-Hand to Unready-to-Hand
Dobromir G. Dotov, Lin Nie, Anthony Chemero
http://www.plosone.org/article/info:doi/10.1371/journal.pone.0009433

domingo, março 28, 2010

Uma tecnologia ligando o passado ao futuro


No início do seu elogiado livro "The writing revolution - cuneiform to the internet" (A revolução da escrita - do cuneiforme à internet, Blackwell, 2009), Amalia Gnanadesikan diz que a escrita é um sistema que ela classifica como uma tecnologia maravilhosa que possibilita, do passado, falar diretamente ao futuro.

“Aprender um sistema novo de escrita é como aprender um código secreto, só que muito mais útil no cotidiano. Uma revolução ocorre cada vez que uma escrita é decifrada. A decifração dos hieróglifos egípcios por Champollion na década de 1820, por exemplo, reintroduziu para o mundo um modo de escrita que era completamente esquecido e muito mal-entendido na época.

Ninguém acreditava que a escrita linear pudesse ser Grego até sua decifração por Ventris na década de 1950. Chegou-se a pensar que os Glifos dos maias não passavam de um calendário complexo, até que sua decifração começou nas décadas de 1950 e 1960.

Nós humanos somos criaturas linguísticas. Nossa comunicação se dá por meio da linguagem e até pensamos tendo-a como base. Então, quando comunicamos nossos pensamentos por meio da escrita, primeiramente nos trajamos de linguagem. De fato, é o que define a escrita. Ela é algo que você lê como 'linguagem' e não um mero conjunto de ideias vagas. Para tornar suas ideias mais específicas, você precisa usar palavras." (citando a autora em http://cienciahoje.uol.com.br/zmi/cienciahoje/revista-ch/2010/268/a-maior-invencao-humana)

A Internet e as adaptações da web provocaram uma espécie de reposicionamento da escrita e da leitura com uma nova forma de emissão da palavra. A postagem tem um código de referência reduzido e simplificado e, de alguma maneira, subverte a estrutura da linguagem. A velocidade na troca da informação fixa uma economia de palavras na entrada de texto em um meio digital.

Uma postagem mostra o estranhamento e a individualidade dos discursos em convivência. A postagem se relaciona com o "differend" * e não com o consenso. Em um formato digital a sensação da percepção dos significados não é universal em sua condição estética.

O diferend não pretende se alinhar a nenhum formato ou uma escrita que represente um pensamento geral, pois ele é o estado instável da linguagem, o sentimento que se tem de não saber , ainda, como colocar o pensamento em frases . O differend coincide com um o estado emotivo do pensamento; é aquela impressão que temos de não conseguir achar as palavras certas para finalizar o nosso discurso.

A Internet cria, assim, uma escrita virtual, uma fala digitalizada que mescla das duas modalidades da língua: a linguagem do pensamento do emissor com sua edição imediata quando lançada no postar.

Na troca veloz da informação o conteúdo só interessa a quem escreve e a quem lê. Assim como é inútil tentar corrigir a língua falada, também parece inútil tentar vigiar e corrigir a língua escrita na web, porque ela é fugaz, efêmera e se dissipa na maioria das vezes ao final de uma interação; raramente chega a ser impressa em papel.

A exatidão e objetividade da verbalização textual distanciaram a escrita dos laços sentimentais e emocionais, que está sendo resgatado no formato digital de convivência e reconstruído na sociabilidade virtual. Inovando, pois a simbologia na comunicação entre parceiros digitais, que trocam mensagens criando símbolos com novos significantes para antigos significados.



* LYOTARD, JEAN-FRANÇOIS. The Differend: Phrases in Dispute. Minneapolis: U of Minnesota , USA 1988. - Lyotard descreve a incomensurabilidade da imaginação e da razão como um differend. O differend é ser encontrado no centro do sentimento sublime: no encontro dos dois 'absolutos' igualmente presentes para o pensamento, a totalidade absoluta quando se concebe e o absolutamente medido quando se apresenta. A situação é análoga a uma colisão de dois jogos de linguagem diferentes: cada um absoluto nas suas regras.

domingo, março 21, 2010

A relevância irrelevante: na velocidade do acesso com sensibilidade imediata


printed paper away, from deviant mind


Calvin Mooers e Mortimer Taube foram dos primeiros a falar sobre relevância entre 1950-55, como pesquisadores pioneiros dos sistemas de armazenamento e Recuperação da Informação; mas a exploração ampla do conceito de relevância apareceu em 1958, durante a "International Conference for Scientific Information" em Washington, novembro de 1958 com a presença de Fairthorne, Vickery, Bar-Hillel e outros.

A relevância em estoques delimitados de informação impressa foi também estudada, a partir de 1957, por Cyril Cleverdon que no Cranfield Institute of Technology em Bedford perto de Londres começou a usar o computador para analisar a eficácia das linguagens de indexação para recuperação com precisão de documentos em acervos estáticos de documentos papel e tinta. Cleverdon definiu matematicamente a relevância e a precisão: 1- a relevância como a habilidade de apresentar itens relevantes durante a recuperação dos documentos em um estoque definido; 2 - a precisão era a habilidade do sistema de armazenamento em barrar itens não relevantes em uma recuperação. As medidas eram calculadas como percentuais do número total de documentos no estoque considerado.

Cyril Cleverdon apresentava seus resultados à comunidade em reuniões chamadas “Cranfield Conferences”, sete ao todo, de 1960 até 1970. As conferências reuniram as pessoas importantes da área das tecnicas de indexação de todo o mundo que desejavam  organizar a  informação papel usando o melhor esquema de indexação.O estudo da medida de relevância para a gestão da informação em acervos definidos e pequenos tinha princípios determinantes e subjetivos:

1 - um julgamento de valor era  realizado pelo usuário avaliador sobre a relevância dos textos existentes em uma base de dados de documentos tematicamente semelhantes;

2- os receptores julgadores precisavam conhecer os textos contidos na base, pois tanto a recuperação  quanto a relevância eram medidas relacionadas ao total dos documentos naquele estoque específico.

As condições de disponibilidade e acesso  da informação mudaram radicalmente na realidade da Internet. Se uma pessoa pesquisar na Web usando um "browser tipo Google" sobre, por exemplo, o tema "organização da informação" obterá cerca de  milhões de referências sobre o assunto. Isto impede qualquer decisão onde se supõe haja um conhecimento do conjunto de documentos.

A relevância online é decidida pelo usuário no momento de sua solicitação e em tempo real,  sem o conhecimento do conjunto dos  documentos de todo o  estoque para uma  decisão item a item. O julgamento é imediato e no processo de busca. A relevância passou a ter uma pluralidade de nuances para atender o desejo específico de informação de cada receptor.  A relevância de um conteúdo entre de milhões de itens semelhantes é ponderada pelo viés que cada  do texto terá para o receptor. Uma descontinuidade cambiante, uma relevância móvel dentro da mesma matiz temática.

Está relevância descontínua é a única possível para conteúdos digitais de infinitos entrelaçados por rotas  distintas, traçadas por cada usuário,  onde os documentos em uma lincagem tem o significado em construção; e  onde o texto de ontem não será o mesmo de hoje e irá depender do caminho percorrido.As medidas perderam sua eficácia quando sua análise se mudou do sistema de armazenamento local para a autoridade do usuário online em rede.  As medidas de recuperação, relevância, e precisão teriam nova conceituação para conteúdos digitais em rede.

Na visão do sistema de armazenamento e recuperação localizado "off line" e com documentos impressos,  as velhas medidas de avaliação reinavam. Mas este sistema virou uma rede de informação e conhecimento. O receptor e os próprios documentos estão do lado de fora, na ambiência desta rede de armazenamento e recuperação. Cada vez mais se entende que o lugar do conhecimento não esta no estoque, mas sim na consciência do receptor fora de qualquer esquema de gestão ou controle de um sistema de elementos interligados de armazenamento e recuperação.

Enfim, é válido lembrar a história dos conceitos passados e sua articulação com a técnica da época  para entender o presente e saber que o passado ficou no passado e não pode ser reconstruído no presente por maior que seja a simpatia dos antigos atores e suas práticas. O que passou passou para sempre.

Aldo de A. Barreto

(revisto em 30/06/2013)


quinta-feira, março 04, 2010

Redes e sistemas, estoques e fluxos

A preocupação com a organização da informação via idealização dos sistemas de armazenamento e recuperação da Informação é uma condição que se transformou em ideologia  nos últimos 50 anos. Tão forte é o seu impacto na formação das ideias da área de informação que por vezes aceitamos que a parte represente o todo, na medida em que o Sistema de Armazenamento e Recuperação foi considerado o próprio Sistema de Informação e Conhecimento. O que não é verdade.

Isto seria uma aberração teórica pois o receptor, que é o local onde se realiza a absorção do conhecimento está fora do sistema; está localizado na sua ambiência ao contrário ele seria um recurso ou elemento do sistema e poderia ser controlado.Pela teoria sistêmica tanto o usuário, como o gerador/autor da informação estão fora do sistema de armazenamento e recuperação da informação , estão em sua ambiência, pois o sistema não tem qualquer controle sobre eles.

O sistema de recuperação da informação obedece um rígido formalismo técnico que foi necessário para os propósitos de gerenciamento e controle em uma determinada situação histórica. Só a partir dos anos 80 novos modelos de analisar o mundo provocaram um reposicionamento dos agentes que operam a informação principalmente devido:

1. uma nova visão conceitual de como a informação se relaciona com o conhecimento e com o desenvolvimento humano;

2. aparecimento do modelo cognitivista como uma nova explicação para as atividades relacionada às atividades socias aplicadas e a condição humana;

3. a noção de rede de elementos interligados como um modelo mais adequado. que a teoria sistêmica, para explanar a questão da informação;

4. o entendimento que existe na cofiguração da informação uma condição estática representada por seus estoques de documentos e uma condição dinâmica representada pelos fluxos de sua transferência para o usuário.

Uma razão para se confundir os conceitos de informação e conhecimento é a falta de compreensão de que conjuntos de documentos formam um estoque estático e o conhecimento é um fluxo dinâmico, coisas impossíveis de serem igualadas.

Então para reforçar o que indicamos vale rever os conceitos de rede e de sistemas até para entendermos, que é impossível ter um sistema de acervos e que este operam em rede. Um sistema é um conjunto de elementos interconectados e interdependentes de modo a formar um todo organizado para alcançar um fim comum. Todo sistema possui um objetivo a ser atingido e é um conjunto de componentes interligados e interdependentes, isso quer dizer se tirar um único elemento do sistema ele para e deixa de operar.

O ambiente é alguma coisa que está fora do controle dos sistemas, mas é também algo que determina seu funcionamento. Assim, se o sistema opera em um clima muito frio ou quente, o seu equipamento deve ser planejado para resistir a severas mudanças de temperatura. Falaríamos então que as mudanças de temperatura ditam as possibilidades de desempenho do sistema mas, contudo, o sistema nada pode fazer com respeito às mudanças da temperatura. Como com o usuário e o gerador de informação.

Já o termo genérico “rede” define um conjunto de entidades (objetos, pessoas,atividades) interligadas uns aos outros. Uma rede permite unir  um fluxo de elementos materiais ou imateriais. Uma estrutura em rede indica que os seus integrantes podem se ligar a todos os demais. O conjunto resultante é como uma malha de múltiplos fios, que pode se espalhar indefinidamente para todos os lados, sem que nenhum deles possa ser considerado principal ou central, nem representante dos demais. Não há um elemento chefe, o que há é uma vontade coletiva para realizar determinado objetivo. Se um ou mais elementos se desligarem da rede isso não ocasionara qualquer interrupção em seu funcionamento. A rede se reconstruirá com a partir dos seus nodos e laços existentes. Estoques e fluxos podem confundir os conceitos de informação e conhecimento.

Aldo de A Barreto

sábado, fevereiro 27, 2010

Máquinas e mentes




A ciência avança pela invenção de novos instrumentos e pela descoberta de novos conceitos e arcabouço de ideias. Peter Galison e Thomas Kuhn são grandes exploradores do processo de descobrimento cientifico na idade moderna. Galison publicou "Imagens e Lógica" em 1997 e Kuhn "A estrutura das revoluções científicas" em 1962. Os dois livros tem em aparência pouca coisa em comum. O livro de Galison contém centenas de imagens de maquinas científicas e o de Kuhn só palavras. Pois o primeiro acreditava que o avanço da ciência ocorria através dos seus instrumentos e Kuhn pela formulação de novos conceitos e teorias. Um colocava o foco no instrumental o outro nas ideias.

Assim, as áreas científicas tem desenvolvido sua própria cultura em relação à harmonia entre o tratamento que dão ao seu instrumental em convivência com suas ideias. Tradicionalmente os astrônomos, por exemplo, quando iniciam um projeto já tem pronto todos os aparelhos necessários àquela pesquisa. Outras áreas compram seu instrumental ou se associam a campos com a expertise, como os biólogos, no sequenciamento do DNA. Mas, a maneira de lidar com as máquinas na ciência envolve uma enorme diferença de custo e tempo na sua evolução de suas pesquisas. Os projetos de descoberta dos mistérios do céu e o projeto genoma contam a historia da harmonia dos instrumentos com as ideias relacionados ao custo envolvido e tempo de realização de um plano. Existem, ainda, umas poucas áreas que fogem dos instrumentos necessários para realizar seu intento e suas pesquisas e criam um impasse entre o desenvolvimento de suas ideias e as aplicações necessárias para cumprir seu objeto.

Maquinas são importantes, também, para derrubar preconceitos. Ao criticar abertamente o sistema geocêntrico de Ptolomeu, Giordano Bruno acabou recebendo uma advertência formal da Inquisição, que proibia o ensino do sistema heliocêntrico de Copérnico. Mas uma luneta ajudou a derrubar a crendice. Galileu aperfeiçoou a luneta, inventada pelo holandês Lippershey e em 1610 observou montanhas e crateras na Lua e manchas no Sol. Suas descobertas ajudaram a tirar o homem centro do Universo na perfeição dos céus. Mas provou ideias há muito existentes só no papel.

A supervalorização das máquinas incomodou, em 1930, Sigmund Freud que em seu texto "O mal-estar na civilização" escreveu que o homem estava se tornando um deus-prótese, com muitas extensões criadas – e por criar – pela cultura e pela ciência, sem com isso ficar mais feliz. A tecnociência fazia do conhecimento aplicado um fim em si mesmo. No balanço do “Breve século XX”, o historiador Eric Hobsbawm concorda que: “Não houve avanço técnico que não fosse acompanhado de uma pincelada pessimista e sombria sobre o futuro. Mas, não houve um século tão cheio de ideias e ao mesmo tempo tão pouco à vontade com elas desde a retratação de Galileu”. Mesmo, assim, o historiador analisando o século XX diz que, nos últimos cinquenta anos do século XX a humanidade viu inserir no seu convívio mais inovações do que em todo o resto da sua história. O mundo mudou desde 1950 com fortes máquinas e grandes ideias.

Seguindo a fase tecnicista, Paul Otlet lançou em 1932 o seu “Tratado de Documentação” em que pretendia reunir uma considerável quantidade de aparatos mecânicos como o telefone , o telegrafo, imagens em telas, a radiola para transferir de maneira mais adequada a informação de sua fonte aos que dela necessitavam. E, no pós-guerra de 1950, Vannevar Bush preocupado, com o mesmo problema preconizado por Otlet advertia que: "Profissionalmente nossos métodos de transmitir a informação estão envelhecidos em anos e são inadequados para sua finalidade. O tempo total que é gasto em na relação imprópria da escrita versus disponibilização tem uma defasagem alarmante. O conceito de Mendel das leis da genética, por exemplo, ficou perdido para o mundo por uma geração porque sua leitura não alcançou os poucos que eram capazes de se apropriar de suas ideias... grandes realizações se perdem na massa de escritas irrelevantes”. Bush imaginou criar um instrumento para minorar o problema a máquina Memex, unificando os “gadgets” de Otlet em um artefato único que nunca se concretizou e ficou perdido na cultura de uma área que tem aversão a máquinas, mas não pode se explicitar sem o uso delas.

A informação é uma atividade social aplicada que só se apetece a tratar das tramas conceituais de uma ideação não partilhada em consenso pelos seus pares, teorias que não estão no tempo certo com a atualidade de suas máquinas. Mas como realizar seu objetivo e suas aplicações sociais se para isso depende de máquinas, estruturas e fluxos técnicos que desampara.

A validade, a fonte e o próprio conhecimento da área estão se modificam continuamente ao sabor de uma tecnologia intensa e altamente mutante. Cada vez que surge um novo instrumento ou uma melhor máquina para adequar geradores, receptores e um estoque de documentos, as ideias correm atrás para tentar explicar com um arcabouço teórico o que há muito já está sendo utilizado na prática pela sociedade.



Notas:

- Freeman,J.D. , The Sun, the Genome and the Internet, Oxford Press, 1999.

- Paul Otlet - Tratado de Documentação

http://www.youtube.com/watch?v=qwRN5m64I7Y


- Hobsbawm, E., Era dos Extremos – o Breve século XX, Cia. da Letras , São Paulo, 1995.

- Memex - http://www.youtube.com/watch?v=uj6ADC8ezxk&feature=related




sábado, fevereiro 20, 2010

Um terremoto de palavras permitindo uma nova escrita




"Escrever é retirar-se. Não para a sua própria tenda para escrever, mas para a sua própria escritura. Cair longe da linguagem, emancipá-la ou desampará-la, deixá-la caminhar sozinha e desmunida. Abandonar a palavra deixá-la falar sozinha o que ela só pode fazer escrevendo. Abandonar a escritura é só lá estar para lhe dar passagem, para ser elemento diáfano de sua procissão: tudo e nada. Em relação à obra o escritor é ao mesmo tempo tudo é nada. “Como Deus: tens ai a prova de sua onipotência; pois Ele é ao mesmo tempo o todo e o nada” (7)

Assim, seguindo o pensamento de Derrida, também, as Lexias de Barthes são apontadas como fragmentos do texto que caracterizam uma unidade de leitura, um corte completamente arbitrário sem qualquer responsabilidade metodológica. A lexia é o envelope de um volume semântico, a linha saliente do texto plural. O local onde acontece um terremoto de palavras dando ao texto a chance de sair para um outro. O texto mesmo que seja ele o primeiro ou um dos seus muitos entrelaces será sempre quebrado, interrompido em total desrespeito por suas divisões naturais: "no texto se subtrai toda a ideologia de totalidade para precisamente maltratar o texto cortar-lhe a palavra." (6)

Os artesões da escrita estão como a espreita para agregar mensagens, para como um "bricoleur" formar outros textos que permitam novos significados relacionados. No pensamento dos Mitemas de Lèvi-Strauss há o abandono de toda a referência a um centro, um sujeito, um contexto específico ou uma origem absoluta. O discurso nas estruturas acêntricas dos mitos não tem um sujeito ou um centro absoluto. (1)

O mito de referência não deriva unicamente de uma posição central, mas de sua disposição irregular no interior do emaranhado de fragmentos que se interconectam: " O mito e a obra musical são como maestros de uma audiência de executantes. A música e a mitologia confrontam o homem como objetos virtuais onde somente a sombra é atual" (8)

“Peter Gay, em seu livro Modernismo (2), a propósito de Baudelaire diz que a sua voz era “a voz da poesia pura e simples”. Daí a resposta à sua própria pergunta sobre a arte pura, segundo uma concepção moderna: “É criar uma mágica sugestiva, contendo a um só tempo o objeto e o sujeito, o mundo exterior ao artista e o próprio artista.” É o todo estruturalmente sempre um todo". Um conjunto formado, natural ou artificialmente, pela reunião de partes ou elementos, em determinada ordem ou organização desfamiliarizada. O emaranhado de textos digitais são alinhavados com múltiplas sensibilidades.

Vai daí que o estruturalismo de Lévi-Strauss esteve comprometido com a busca de outros universos da arte e para isso, buscou constituir uma lógica do inconsciente nas narrativas das coletividades cujas vozes contam o mundo segundo sua sensibilidade. Expressões de uma mediação gráfica que se esquiva dos códigos fixos no procedimento aberto dos linguajares de convivência.

Para Lévi-Strauss a diferença entre o primitivo e o moderno não está propriamente no campo das formas de representação, mas na forma de expressar estas relações. A condição culinária do autor apresentada no cru e no cozido está coerente com o abandono de toda a referência a um centro, um sujeito ou uma origem absoluta. Assim o discurso das estruturas sem centro determinado não tem um sujeito ou ponto absoluto. O núcleo tutor da narrativa não deriva unicamente de uma posição central, mas de sua posição irregular no interior do emaranhado de fragmentos que se interconectam. São partes que tem significado quando na bricolagem do todo.

Cada conjunto de narrativas pertence a uma ordem do discurso e uma representação gráfica da linguagem. Um conjunto de enunciados virtualmente disponível forma uma rede onde a crua informação pode transformar-se quando cozida em conhecimento. O pensamento da enunciação em tempo real difere do pensamento sequencial interiorizado no formato. Caminhamos cada vez mais para depender de coisas exteriores a nosso corpo na ação das trocas de informação. Exterioridades sensíveis são próteses de alongamento para uma sociabilidade elaborada como uma partitura de poética própria. A escrita constitui-se, então, em uma representação exterior, no espaço e no tempo real, sendo mais que nunca uma um episódio sensível no utilizar das palavras.

Estas exterioridades sensíveis vão juntando partes e peças para formar a matéria essencial do significado, em um contexto que tem um início sem final destinado por forma ou tema. Como o bricoleur Lévi-Strauss, onde sua narrativa inicia em um ponto qualquer do espaço e tempo. A sua estratégia consistia em estabelecer diversos pontos de partida, mas nenhum de chegada e sua ideia de mito como o conhecimento jamais toma uma forma definitiva, pois ao contar um pode surgir sempre um outro, indefinidamente.


Notas:

[1] O Modernismo de Lévi-Strauss texto de Carlos Vogt em Com Ciência No. 108 - 10/05/2009 http://www.comciencia.br/comciencia/handler.php?section=8&edicao=46

[2] Gay, P. Modernism. Nova Iorque/Londres: W.W. Norton & Company Inc.; 2008. p. 40.

[3] "O cru e o cozido - Mitológicas 1", recensão por Mariza Werneck Mariza Professora Doutora do Departamento de Antropologia da PUC-SP.

[4] Lèvi-Strauss, C., O Cru e o Cozido,. Brasiliense, São Paulo, 1991.

[5] Um mitema é uma unidade de significado que relaciona estruturas temáticas existentes em uma determinada narrativa. O pensamento de arranjo em tempo real mostra um trabalho de composição da narrativa que usa uma estrutura técnica desconcebida. http://www.dgz.org.br/out04/Art_01.htm

[6] Barthes, R., O Rumor da Língua, Edições 70, Lisboa, 1987

[7] Derrida, J., A escritura e a Diferença, Editora Perspectiva, 2ª edição , São Paulo , 1995.

[8] Lèvi-Strauss,C., O Pensamento Selvagem. 3ª edição, Papirus, Campinas, 1989.


* Este texto aparece no Datagramazero de fevereiro de 2010 em Colunas
www.dgz.org.br

domingo, janeiro 31, 2010

A informação superposta


Considere uma pesquisa para as obras de Shakespeare. Com a tecnologia que existe hoje, para um determinado termo de sua obra podemos encontrar em todas as linhas de sua obra o lugar onde o mesmo termo é usado nos seus escritos completos. Esta concordância é um exemplo do que chamamos de seguir determinados conteúdos sobrepostos e que se apresentam em camadas cronológicas. O trabalho consiste em suplementar uma informação criando todas as suas menções em um mesmo contexto de aplicação.

Exemplos, deste tipo de necessidade de seguir informações, sobrepostas em camadas são: os prontuários médicos, arquivos cronológicos, a notícia em um canal de mídia, as camadas de dados e reflexões de uma pesquisa e até mesmo reconstrução de uma discussão, escrita e oral, sobre o desenvolvimento ou projeto de um produto ou serviço em um site ou serviço de email tipo wave para convivência empresarial.

A informação sobreposta deve ser linkada para uma referenciação ou estudo do problema em suas diferentes fases de ocorrência. Esta linkagem normalmente acontece para documentos relacionados em camadas verticais e não se configura com o critério de uma abordagem hipertextual onde a saída do texto tutor é de livre escolha no espaço e no tempo.

As informações quando sobrepostas podem ser administradas colocando marcas nas mensagens que vão em seguimento no empilhamento das camadas, a partir de um documento tutor inicial. As camadas de base e seu seguimento podem incluir múltiplos e heterogêneos formatos de documentos, o que requer um esquema de endereçamento inteligente, para reunir as informações armazenadas em todas as camadas incrementais da coisa estudada. A compilação deve permitir a criação e a resolução de um sistema de marcas para os documento superpostos já existentes e os que virão a se empilhar.

Na informação sobreposta seguimos os links como se fosse as pegadas deixadas por um caminhar na arquitetura de conteúdos específicos. Esta informação se relaciona diretamente com o documento tutor que é aquele ao qual se adicionam camadas em um conjunto encadeado. O valor do documento é dado pela possibilidade de “montar” todas as camadas do encadeamento e de uma aplicação que permita o seu seguimento em completeza. Um só documento do conjunto não forma um valor que só existe se é agregado pela soma de toda a série.

O número crescente de informações eletrônicas, fontes acessíveis a uma audiência mundial, fornece uma oportunidade sem precedentes para estudar os mecanismos e as aplicações de organização e controle de informações sobrepostas em contextos específicos. Tais aplicações devem permitir explorar e organizar documentos digitais espalhados, mas cujo valor está na coleção das fontes que estão em uma disposição de camadas sobrepostas.


Bundles in Captivity: An Application of Superimposed Information
Lois Delcambre e outros
http://web.cecs.pdx.edu/~lmd/papers/captivebundles.pdf

segunda-feira, janeiro 11, 2010

O espaço da memória




Quando falo do estoque de informação, um acervo armazenado, penso nos artefatos com que operam os agregados de informação. Estes  estoques, que são estáticos, não geram conhecimento. Existem como possibilidade de uma condição de conhecimento. Só com uma passagem adequada atingem o receptor.

Para haver conhecimento é necessária uma transferência de informação destes estoques para a realidade dos receptores e uma conjuntura favorável para sua apropriação pelos indivíduos. Nesse momento nada é mais subjetivo e privado que a assimilação de um conteúdo pelo receptor. Na solidão desta interiorização o receptor é uno e esta é uma a apropriação dele, de mais ninguém.

Conhecimento sendo uma passagem é um fluxo de estruturas simbólicas  um processo que se realiza no oculto espaço de uma subjetividade. É esta celebração  se passa em dois mundos: o do criador da mensagem e de quem a aceita como conhecimento.

O sistema tradicional de armazenamento da informação em estoques obedece a um rígido formalismo técnico e reducionista, que serve aos propósitos do seu gerenciamento. São sucessivos processos de seleção e reformatação de conteúdos simbólicos que sob o pretexto de melhorar localização e recuperação; interferem com o sistema de significação e com o universo semântico dos receptores.

A partir dos anos 80 novos modelos tecnológicos promovem um reposicionamento destas práticas de  principalmente devido a: uma nova visão conceitual de que a informação se relaciona com o conhecimento e com o desenvolvimento humano devendo se respeitar, portanto, a integridade de sua inteirice. Ao afetar esta integridade podemos afetar o processo de conhecimento como um todo.

A visão conceitual entende que os estoques de informação representam um importante recurso no processo de geração do conhecimento. A geração do conhecimento é uma condição complexa na qual os estoques estáticos representam uma etapa. O problema é que estes estoques com ou sem controle, crescem indefinidamente; se avolumam em um tempo sem limite; sua abundância degenera a potencialidade dos conteúdos na recuperação e distribuição.

Estes estoques se agrupam exponencialmente, em estruturas que lhe servem de repositório. A coisa toda poderá ruir em pedaços, devido ao seu próprio peso a menos que se modifiquem as proporções relativas da sua estrutura dos  em relação ao volume de seu conteúdo físico ou se modifique a constituição física.

Nossa memória  só funciona bem, porque nos é dada a capacidade do esquecimento. Um deslembramento natural do armazenado. Na memória digital dos documentos eletrônicos parece haver, também, um descarte natural associado ao acesso. Se não acessado um documento é descartado ou vai para um museu digital. Esta é uma peregrinação já trabalhada pelos que procuram fazer o árduo serviço de preservação digital.

Toda informação arquivada e de domicílio seguro pode ser retirada da memória pelo deslembramento. O digital quando salvado em uma memória de secundária pode ser esquecido e iniciar a sua relação com a história.

Nos ritos de informação é a memória,, que possibilita a relação com o saber É o conjunto de atos contínuos, que se acumulam no tempo e podem ser relembrados; são cognições prévias nas quais o indivíduo pode reelaborar o seu mundo modificando o seu espaço vivencial no passar do tempo. Assim opera a densidade estoque de informação armazenada, a massa e o volume que ocupam, tem condições agregativas e aderentes enquanto disponibilizadas pelo uso

Esta densidade quando humanizada é o que faz ser, completamente diferente a qualidade do pensar de um homem mais antigo e de uma criança. Haveria sim, nestes casos mais memória no elefante que na pulga.

AAB

Revisto em 17.11.2014